Passados estes seis anos, a irmã mais velha do socialismo e as suas instituições do poder em Praga, que fizeram de Alexander Dubcek um jardineiro, decidem chamar Emil [Zátopek] à capital com a ideia de o promoverem, fazendo dele empregado do lixo. Esta parece uma ideia verdadeiramente boa, uma história para o humilhar, mas rapidamente se revela não ser tão boa quanto isso. Para começar, quando percorre as ruas da cidade atrás do caixote com a sua vassoura, a população reconhece imediatamente Emil, toda a gente vai à janela para o ovacionar. Depois, os seus camaradas de trabalho recusam que ele recolha o lixo e o próprio contenta-se em correr com uma passada curta atrás do camião, debaixo de encorajamentos, como dantes. Todas as manhãs, aquando da sua passagem, os habitantes do bairro destinado à sua equipa de limpeza descem até ao passeio para o aplaudirem, esvaziando o seu próprio lixo no respectivo caixote. Nunca nenhum empregado do lixo do mundo terá sido tão aclamado. Do ponto de vista das instituições do poder a operação é um fracasso.
Jean Echenoz, Correr [trad. Virgílio Tenreiro Viseu, Cavalo de Ferro, 2011, p. 117]
Jean Echenoz, Correr [trad. Virgílio Tenreiro Viseu, Cavalo de Ferro, 2011, p. 117]