notas culturais, fragmentos do exílio - venturabravo [at] gmail [dot] com

23.8.09

personalidades (1): JMJ

Talvez uma das poucas pessoas com um pensamento político (e da sociedade) integro, independente, sério, isento (com afinidades declaradas) e inteligente em Portugal (e das personalidades políticas mais odiadas. Temos dificuldade em reconhecer e, ainda mais, aceitar o mérito neste país). Aqui expresso a minha simpatia por José Miguel Júdice. É bom lembrar quem interessa - numa altura em que todas parecem iguais (i.e., indiferentes) - mesmo que não concordemos e venha assim do nada.
Nota: JMJ escreve às 6ªs no Público. E foi triste (pois o canal ficou mais pobre) ver "A Regra do Jogo" (título do deslumbrante filme de Jean Renoir) acabar - programa da SIC Notícias onde JMJ discutia a actualidade com António Barreto (e lá vai fogaça)
.

20.8.09

jornais (2): as mulheres no Afeganistão

Em dia de eleições no Afeganistão, uma reportagem (de há dois dias) de Ramón Lobo (jornalista em Cabul, com o interessante blogue En la boca del lobo) no El Pais, sobre as suas mulheres, vítimas de uma nova lei que escraviza (e tortura) as afegãs xiitas (de etnia hazara) à libido masculina. Hoje, no Público, uma notícia que aflora o mesmo assunto e as eleições.

19.8.09

misticismo (bélico) n'os vales


Música ("The Valleys") do segundo e melhor álbum da "girls band" Electrelane, The Power Out (2004).
Nota (para os incautos): a imagem não se altera, no entanto, tem vários pontos de interesse: por exemplo, pôr o som alto e desligar o ecrã.

18.8.09

... averdade (1): porque cá tudo chega mais tarde

António Lobo Antunes continua profícuo, com um novo romance em estado adiantado, Raquel dos Santos (título provisório), obra para ser prelada (sic) ainda em 2009.
Entretanto a editora (que não se quis identificar) deixa-nos algumas indicações sobre esta viragem estilística, "mais tropical", do eterno candidato a novel (sic): "É a história de um escritor e duma mulher exótica que está a fazer um doutoramento sobre esse mesmo escritor. Conhecem-se e logo se desencadeia um magnetismo selvagem e devastador entre os dois. Ele é sádico, ela é masoquista. Ele é grisalho, ela é jovem e fogosa. No final ela consegue acabar o doutoramento com mérito; do escritor não podemos dizer mais, para ver se as pessoas compram."

17.8.09

Num parque nudista poder-se urinar fazendo ioga.

(o calor que faz neste quarto. uff!)

16.8.09

La Grande Illusion (histórias no cinema)


Filme de Jean Renoir (1937).

Guerra à antiga é uma grande ilusão.
Três grandes actores (três personagens tipo): Jean Gabin, Pierre Fresnay e Eric von Stroheim (a fazer de "si mesmo"). Belíssimo realizador de Blind Husbands (1919; uma das melhores primeiras obras do cinema) e o épico Greed (1924, filme incontornável na história do cinema), Stroheim viu a sua carreira de metteur en scène ser interrompida por (ou pelo acaso de) Gloria Swanson , em Queen Kelly (1929), filme em que dirige a estrela do período surdo, que era também financiadora do filme e uma das poucas pessoas ainda dispostas a apostar no excêntrico realizador (mas a meio da rodagem desentenderam-se e o filme ficou incompleto. Os pormenores ficam para outro dia).

Com a mesma Swanson, Stroheim contracenará como seu mordomo (Max Von Mayerling), no inesquecível Sunset Boulevard, 1950, de Billy Wilder (realizador cómico [e genial] que dá continuidade há herança recebida do mestre absoluto, Ernst Lubitsch [To Be or Not to Be, 1942, talvez a obra-prima absoluta da comédia], de quem Wilder chegou a ser argumentista). Stroheim, Lubitsch e Wilder, três realizadores subversivos do humor (como todos os grandes da comédia), mas não exclusivamente.

Do humor Renoir é igualmente mestre, tanto com este Illusion, como com o seu filme maior La Règle do Jeu (1939), enormíssimo prazer cinematográfico (ou Le Carrosse d'Or, 1952, o teatro no cinema - filme que é todo ele uma peça). Em La Règle, talvez lembrando-se de Stroheim, Jean Renoir é realizador e actor.

Stroheim é Von Rauffenstein (em La Grande Illusion)

O cinema é feito de ligações, coincidências, reincidências. A memória idem.

(... pelo acumular de superlativos e de obras-primas do cinema peço desculpa, pois sei que assim de enxurrada apagam-se uns aos outros. Evocar, reviver, marcar, transformar, voltar a imaginar as imagens agora difusas.)
13 de Julho

Sete dias sem uma nota, um facto, uma reflexão; posso dizer oito dias, porque também hoje não tenho que apontar aqui. Escrevo isto só para não perder longamente o costume. Não é mau este costume de escrever o que se pensa e o que se vê, e dizer isso mesmo quando se não vê nem pensa nada.
(Memorial de Aires, 1908, Machado de Assis)

11.8.09

reflexos

Ontem à meia-noite houve fogo de artifício aqui ao pé. Quando dei por mim estava a enviar sms's de felicitação e exaltação de ano novo.
28 de Julho

[...] Quaisquer que sejam os costumes novos e ligações de família, e por maior que tenha sido a ausência, o lugar onde alguém passou os primeiros anos há-de dizer à memória e ao coração uma linguagem particular.
(Memorial de Aires, 1908, Machado de Assis)

5.8.09

dinastias

Da terra de onde venho a endogamia é costume; faz as maravilhas da população.

tempos mortos: Miami


(Dexter, season 2, [TV series])

Miami é passatempo agradável, belíssimo entretenimento (Miami Vice, 2006, de Michael Mann; Scarface, 1983, de De Palma; ou Some Like it Hot, 1959, de Wilder - também no mesmo saco).
Dexter é uma série deliciosa, tanto na sua estética bem como na atmosfera (luz, música, ambiente). E Michael C. Hall (como Dexter Morgan) é irresistível.

O que faz de Miami um local tão apetecível, actualmente, para as séries de televisão?

4.8.09

Morel (2)

"Bate com a mão mesmo", Joana pediu.
Apoiado na mão direta, dei um tapa com a esquerda no rosto de Joana. Joana fechou os olhos, o rosto crispado, não emitiu um som sequer. Dei outro tapa, agora com a mão direita, com mais força.
"Bate, bate!"
Bati com violência. Joana deu um gemido lancinante. Continuei batendo, sem parar.
"Me chama de puta..."
"Sua puta!"
"Mais, mais!..."
Chamei Joana de todos os nomes sujos, bati com força no seu rosto. Nossos corpos cobertos de suor. Lambi o rosto de Joana, em fogo das pancadas recebidas. Nossas bocas sorviam o suor que pingava do rosto do outro. De dentro de mim, de um abismo fundo, vinha o orgasmo, uma pressão acumulada explodindo.
(O Caso Morel, 1973, de Rubem Fonseca)

Outro Morel literário (fantástico e com motivos de romance policial) é o da também estreia de Adolfo Bioy Casares (1914-1999), A Invenção de Morel (1940). Aqui, Morel é o cientista(/cineasta?)-holograma responsável pela arquitectura teórica do romance (o cinematógrafo que permite a ilusão do narrador-protagonista: os turistas rotineiros que não o vêem). O narrador, fugitivo, só, numa ilha de espectros (sombras cinematográficas), único corpo real numa trama virtual, persegue, em registo diarístico a mulher de Morel, Faustina, incorpórea, sem alma, condenada à eternidade.

O (Paul) Morel de Rubem Fonseca (O Caso de Morel), por sua vez, encarcerado numa (ilha-)cela viaja com seus escritos (de que se arrepende várias vezes) e com objectivos fixos de performance física: bater o record presidiário de mil flexões diárias.
A família - mote activado pelo artigo "A Sagrada Família" (P2 [Público], 2.8.09), de Pedro Mexia - é conceito lacunar e, ao mesmo tempo, nostálgico n'O Caso Morel. Paul Morel, esquelético e febril, com ar de pneumónico, alimenta-se (de), e consume-se em mulheres; tem devaneios e partindo deles quer formar uma família feliz: ele, macho alpha em alcateia de mulheres. Morel apegado a uma ideia oportunista e distópica de família.

(Lilian [Carmen])
(...) ser puta é muito chato, é muito melhor ser mulher de família... Tenho dito. (Lilian passa o microfone para Aracy.)
(Joana)
Porque de dia ele mata os porcos, os cabritos, ouve os bramidos e se cobre de sangue e à noite vai para a cama com a filha, a mulher que ele ama e que o ama, e assim, fazendo o que gosta, o inocente e bom homem só pode ter uma mente saudável.
(O Caso Morel)
A minha Anabela vai-se embora. Leva-me as fantasias depois de um flirt prometedor.

3.8.09

Morel (1)

O meu pau enrijecido fica portentoso, modéstia à parte; mole, ele quase desaparece. Quem entendesse de pênis, como W. H. Auden, por exemplo, ao ver o meu, amolecido, saberia pelos vincos da pele, que, duro, ele aumentaria muito de comprimento e largura, e ficaria roxo, coberto de veias salientes. Mas nem todos têm olhos de poeta para ver. (O Caso Morel)

Rubem Fonseca (n. 1925) é cinema. No seu primeiro romance, O Caso Morel (1973), é literatura erótico (/pornográfico)-policial (mas porquê reduzi-lo?), reflexão sobre a arte contemporânea, e continua sendo cinema.
"Você mandou alguma coisa para a Bienal?"
"Mandei. Conexão."
"Conexão?"
"De esgotos. Vários tubos ligados, um intestino quadrado."
"Foi aceito?"
"Foi."
É pungente, humor seco, debochado, directo, cortante, transgressivo, de moral duvidosa (a melhor). As personagens são marcadas em algumas palavras.
"Entra dentro de mim... quero que você faça tudo comigo!" Joana queria ser espancada, aviltada, sodomizada, queria ter o rosto lambuzado pelo sêmen. Fiz sua vontade.
O livro foi lançado em plena ditatura miliatar e logo confiscado pelas autoridades.
Paul Morel (ou Morais, no B.I., porque Morel é artístico, e ele logo se envergonha desse maneirismo) é artista de vanguarda, eclético, protagonista deste romance (a par de Vilela). Joana (na auto-biografia de Morel) ou Heloísa Wiedecker (na realidade ficcional) é a perturbante (e memorável) jovem amante de Morel, por ele assassinada. O romance é Morel em sua cela da prisão fazendo flash-backs através da auto-biografia que vai escrevendo, intercalada com conversas com o ex-'policial' e escritor Vilela, que tenta entrar na vida de Morel, percorrendo itinerários da biografia e passado (duas coisas com algum grau de diferença). Em sua biografia vão desfilando as mulheres de Morel (e de Fonseca): Joana (jovem burguesa masoquista com pendor para a arte), Isménia (Aracy, "pintora naive"), Carmen (Lilian Marques, ex-prostituta), Elisa Gonçalves (Marta Cunha, "mulher rica e famosa") - duplas, escondidas em pseudónimo literário, a família de Paul Morel.

(Morel)
"Eu saio na frente. Vou buscar o chicote e te encontro no apartamento."
Exit Joana.
Os 'exits' de joana me davam calafrios.

2.8.09

exposições (1): porque ele não é só flores


Immortality

1889

... também é rosas.

Exposição temporária de pintura de Henri Fantin-Latour, no Museu Gulbenkian.
Passar uma muito boa e calma hora a flutuar no piso semi-obscurecido da galeria de exposições da Sede (entrada grátis nos Domingos até às 14h).

jornais (1): tráfico humano em Timor-Leste

Estima-se que mais de 12 milhões de pessoas estarão, actualmente, sob alguma forma de escravatura.
Em contra-corrente, na normalmente muito morna (e algo estranha, na falta de melhor adjectivo) revista Plenitude de Agosto (com o Público deste Domingo), a importante reportagem de Francisco Colaço Pedro sobre o tráfico de seres humanos (principalmente de mulheres e também crianças) em Timor-Leste. País vulnerável, minado pela pobreza e corrupção, sujeito (cada vez mais) a um dos mais brutais atentados à dignidade humana.

1.8.09

1. (editorial)

Blogue: narcisismo e exibicionismo. Ontem ao ler um jornal na Internet apeteceu-me um blogue. Como todos os passatempos terá a sua fase mais intensa e os seus períodos de hibernação ou morte. Como todos os outros blogues, provavelmente, durará alguns instantes até que chegue o bocejo, o desinteresse ou o esquecimento subliminar. Sem linha editorial, caprichoso, pessoal, flutuará ao sabor das disposições: ritmo descontínuo. Contradição e alguma inconsequência, talvez, qualidades incontroláveis que o pontuarão. Começa em Agosto, é o acontecimento diferenciador que me inaugura as férias nubladas com algumas abertas.
@ ventura bravo [venturabravo@gmail.com]


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