Hoje (ontem), na sala do Saldanha Residence, poucos minutos depois de Un Prophète começar (justo aí, no debut deste belíssimo filme de Audiard, que no final saindo para o Saldanha nocturno, frio, desolado, o McDonald's igual ao da Place de la République, fome tardia, nostalgia - um cheese e meia-hora de conversa animada com J., vêm-me muitas coisas, muitos filmes à cabeça, sinto-me flutuante), o meu amigo J. me disse, 'o Eric Rohmer morreu, morreu hoje.'
Não acreditei à primeira. Como podia não saber, não ter sabido.
O Eric Rohmer que conheço é este, de 80 e tal anos, de Les amours d'Astrée et de Céladon (2007), o meu filme preferido de 2008, o melhor filme desse ano (seguindo-se-lhe o Aleksandra [2007], de Sokurov). Por mais estranho que pareça foi o meu primeiro filme de Rohmer. Começei pelo fim. E tornou-se desde logo uma referência. Só mais tarde me dei conta que já tinha visto uma curta-metragem sua "Place de l'Étoile" (1965), do filme colectivo Paris vu par...
Rohmer foi o último dos principais realizadres da Nouvelle Vague francesa a que cheguei: primeiro Truffaut, depois Godard, o subversivo Chabrol, o deslumbramento musical com Demy, (que dirão não ser nouvelle vague), Resnais, Rivette (também tardio), e no fim aquele que passou a ser "o meu realizador da nouvelle vague", o mais secreto, subtil, essencial, o que acaba por me definir melhor (que mais diz sobre mim, sobre o que não digo), Eric Rohmer.
[ouço o último álbum de Benjamin Biolay, La superbe (2009)]
No espaço de um ano e meio seguiram-se em diferentes lugares - cinemas, cinemateca, dvds - Ma nuit chez Maud (e apaixonei-me definitivamente), La collectionneuse, Le genou de Claire, L'amour l'après midi (... 'contos morais'), Pauline à la plage, Agente Triplo; e tantos ainda para ver, tantos corpos, tantas palavras, tantos amores/ paixões, tanta beleza, tantas mulheres - as mulheres dos filmes de Rohmer, um espanto, indecifráveis, inqualificáveis (?)
Homem da literatura, os seus filmes são também livros, contos, adaptações de romances. Morreu um mestre, que manteve uma lucidez invejável(-inimaginável) até ao fim, o último filme não é um filme de um homem de 87, mas de um homem imortal (e aqui remeto para o texto do Luís Miguel Oliveira no Público). La Beauté.
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